Thursday, December 31, 2009

TUDA - pap.el el.etrônico

Em associação com Casa Pyndahýba Editora
Ano II Número 13 - Janeiro 2010
Crônica - José Miranda Filho

Don Salubayba, Image from the third world


A Viagem

Tudo o que eles sabiam através dos dirigentes partidários, é que estavam sendo procurados pela Policia Federal, condenados que foram à revelia, por crime de lesa-pátria durante a repressão de 1974, em Picos, Piauí. Por isso deixaram seu rincão de chão bruto e castigado da seca, e se foram para Brasília, na certeza de lá encontrarem abrigo na embaixada de algum país Sul-Americano. Atravessaram estados dentro de um ônibus clandestino sem que quaisquer documentos lhes fossem exigidos. Venceram a primeira etapa da viagem.

Estávamos vivendo um período de caça – comunistas na época da ditadura, enquanto a oligarquia militar enganava o povo através de falsos apelos, como: “BRASIL, AME-O OU DEIXE-O”. Usurparam o poder do direito autoral da dupla Don e Ravel com falsas promessas, empurrando-os ao ostracismo, como lamentavelmente conseguiram fazer com tantas outras figuras consagradas do meio artístico- cultural, político e social que se insurgiram ante as atrocidade que se abateu sobre o país. Todos que divergissem da ordem emanada do poder revolucionário, eram tidos como inimigos da pátria. Miguel e Josias, humildes agricultores do interior do Piauí, vivenciaram esse drama.

Ao desembarcarem em Brasília, desconhecedores da cidade, adentraram ao bar do Alcântara – reduto imensurável de espiões – para se refazerem da longa viagem. Tomando café os dois discutiram perante outros assíduos frequentadores, sobre o que fariam da vida dali em diante.

Após um gole e outro de café , Miguel falou para o irmão:

-Josias, você está contente com o governo que temos?

- Não sei não, irmão! Estamos carecendo de muita coisa no sertão.- Nunca ninguém foi até lá saber do que necessitamos. No governo João Goulart, tinha sementes para plantar, financiamento para tocarmos o roçado, credito nos bancos estatais para prosseguirmos com o desenvolvimento agrícola....Agora depois dessa tal ditadura, não temos mais nada. Prosseguiram nesse papo, após gole e outros.

Em determinado instante, um senhor de cabelos grisalhos que ao longe sentado numa mesa a tudo observava, aproximou-se deles. Pediu permissão para sentar-se e ofereceu-lhes uma cerveja. A humildade dos irmãos, gente simples, não permitia desconfiar de tal solicitude e educação.

A descrença no governo, o inconformismo, a revolta de ter sempre a mesa vazia, as criticas ao sistema, forçaram-os discordarem e, até tecer impropérios à Junta Governante, num lamento que estava na garganta de todos os cidadãos brasileiros.

Josias e Miguel nunca mais foram vistos.

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